sábado, 7 de março de 2009

A$ Razõe$ da Crise?

PARA MELHOR COMPREENSÃO DOS DESIGNADO
“PRODUTOS TÓXICOS” - 2ª Razão
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"Ranieri juntou várias hipotecas individuais num grande pacote que, dividido em partes, podia ser vendido – o tal Mortgage Backed Securities conhecido por MBS. Claramente dito estamos a falar de títulos de valor seguros por hipotecas. A partir daí os compradores de casas pagavam os juros das hipotecas apenas pró-forma aos bancos hipotecários. De facto, o dinheiro caía nos bolsos dos que tinham adquirido os títulos: bancos em todo o mundo, seguradoras, fundos de investimentos e seus clientes. Todos estes compradores apostavam no pagamento dos créditos das muitas pessoas "A".
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Teóricamente este negócio era bom para todos. O cliente recebia o crédito e comprava a casa, o vendedor dos títulos de valor recebia os juros e o banco hipotecário não precisava de esperar anos a fio para receber o dinheiro emprestado. Ele tinha vendido o crédito e já podia atribuir um novo. No início, tudo funcionava às mil maravilhas. Os títulos MBS de Ranieri tornaram-se bestsellers. Outros bancos de investimento entraram no negócio.
Casas de dinheiro e investidores financeiros de todo o mundo queriam estes títulos: o Deutsche Bank, o UBS suíço, o Crédit Agricole francês, o Royal Bank of Scotland britânico, o Grupo Mizuho japonês. A certa altura os pedidos de títulos MBS ultrapassavam a quantidade de hipotecas existentes nos EUA.
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Portanto, era preciso arranjar mais hipotecas. Os bancos hipotecários flexibilizaram os seus critérios de atribuição. Deixaram de pedir capital próprio, não pediam informações sobre os rendimentos, interessavam-se por trabalhadores sazonais e empregadas domésticas. E porque que motivo não devia ser permitido aos desempregados comprar três casas? Em pouco tempo atribuiu-se o nome Suprime a este tipo de crédito – de segunda classe. Nos anos 2000 a 2005 o volume subiu em 495 mil milhões de dólares para 625 mil milhões. Juntamente com os créditos de primeira classe, atribuídos a médicos e advogados solventes, foi possível transformar também as hipotecas Subprime em títulos de valor vendáveis.
Em 2005 o Goldman Sachs distribuiu dez mil milhões de dólares em prémios.
O tom de voz de Ranieri subiu. "Quando inventamos o sistema, a compra de uma casa era uma decisão para a vida!", diz ele. Mais tarde só interessava apostar em preços imobiliários em alta. "Mas os preços podiam baixar, mesmo que não quiséssemos acreditar nisso."
Ele também não queria.
Enquanto as empregadas domésticas e os trabalhadores sazonais especulavam para o futuro, os bancos de investimento inventavam novos produtos financeiros que escondiam os riscos gigantescos destas hipotecas. O que, em circunstâncias normais, seria apelidado de burla tinha agora nomes mais complicados como Collateral Debt Obligations ou Credit Default Swaps.
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Trata-se de títulos de valor que não têm qualquer explicação económica, diz o jornalista económico Wolfgang Münchau no seu livro "Vorbeben.Was die globale Finanzkrise für uns bedeutet" (tradução livre: "Tremor. O que a crise financeira global significa para nós"). Excepto numa coisa: "Que estes oferecem altas taxas aos bancos de investimento que os puseram no mercado."
Estas taxas aumentaram os lucros dos bancos de investimento e foram encaminhadas via pagamentos de prémios para os colaboradores. O Goldman Sachs p.ex., um dos bancos de investimento nova-iorquinos mais antigos distribuiu pelos seus colaboradores um bónus de dez mil milhões de dólares em 2005, no auge do boom. Fazendo as contas, cada colaborador receberia 500.000 dólares, mas não foi assim que o banco fez as contas. Só o administrador de então, Henry Paulsen recebeu 38,3 milhões. Entretanto vemos Paulsen na função de Ministro da Finanças dos EUA. O dinheiro que esta semana procura desesperadamente também foi para o seu bolso.
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Na altura o dinheiro foi dos bancos de todo o mundo para os bancos hipotecários americanos, mas um fluxo secundário levava o dinheiro para os bancos de investimento e seus gestores. Dos bancos hipotecários passou para os compradores de casas. Daí voltavam para os bancos de todo o mundo e para os proprietários de títulos de crédito, se os trabalhadores sazonais e as empregadas domésticas tivessem capacidade de saldar as dívidas e se os preços imobiliários tivessem subidos.
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No centro de Frankfurt existe uma zona de bancos, com um arranha-céus mais alto que os outros. Tem 259 metros de altura e é o segundo maior edifício da Europa. Trata-se de uma torre triangular de vidro e dos últimos pisos irradia um brilho amarelo de noite, parecendo pintado com cores florescentes. É o amarelo do Commerzbank e neste Banco Comercial alemão estão 300 especialistas à procura da antiga fortuna.
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A torre tem 50 pisos e nove jardins artificiais onde os colaboradores podem tomar café e vislumbrar a cidade. No piso 19º nascem bambus, no 35º, oliveiras e quatro pisos acima encontra-se o Departamento Financeiro. Entre os pisos 30º, e 42º, trabalham 300 pessoas. Não dão créditos, nem vendem títulos de valor. Na realidade o seu trabalho nada tem a haver com negócios bancários. Mesmo assim têm actualmente o trabalho mais importante no Commerzbank.
Têm que calcular quanto dinheiro o banco possui ou quanto lhe falta. Mais precisamente: Quanto ainda valem as propriedades do banco, os títulos de valor, os imóveis e os créditos. Chamam a este processo levantamento do valor. Os resultados são enviados para o último piso onde se encontra a Administração, directamente para a mesa de Eric Strutz.
Têm que relatar muitíssimos valores, este mês.
Strutz é o Presidente do Conselho do Commerzbank. Ninguém sabe mais sobre a fortuna do banco do que ele. Tem 44 anos de idade e é um dos mais jovens a ocupar esta posição na Alemanha. É um homem corpulento com um forte aperto de mão. Quando fala olha o interlocutor nos olhos, mesmo quando fala sobre assuntos desagradáveis, dizendo p.ex. "Este desenvolvimento dos mercados não era previsível."
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O Commerzbank investiu 1,2 mil milhões de Euros nos títulos Subprime. Ainda detém a maioria dos títulos, mas já ninguém quer comprá-los. Já não existe mercado para estes títulos. No seu balanço, o Commerzbank vê-se obrigado a contabilizar estes títulos com o valor de mercado exacto. Embora os títulos e as hipotecas ainda existam já não há mercado para eles. O dinheiro desapareceu.
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Uma parte desse dinheiro desapareceu para sempre nas casas vazias e em eminente degradação, mas a outra parte provavelmente reaparecerá. Na realidade ainda há detentores de créditos que pagam as suas dívidas. Muitos americanos conseguí-lo-ão. Trabalharão mais, gastarão menos e pagarão os créditos. Desta forma irá dinheiro para os proprietários dos títulos, voltará a haver compradores para eles, abrindo assim o caminho para voltarem a ter um valor de mercado. Só é preciso aguardar até que o caos se resolva. Tal como faz o pequeno accionista, cujas acções de veículos se encontram no valor mais baixo de sempre. Se for inteligente e tiver a capacidade financeira, espera até que a conjuntura se recomponha. Depois, o valor das acções aumentarão e o dinheiro voltará.
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O problema é que os bancos não podem esperar. "Temos que apresentar um relatório trimestral a cada três meses, um relatório anual de doze em doze meses", diz Sturtz. Embora os governos tenham alterado as regras do balanço na consequência da crise, os bancos continuam a ter que avaliar a maioria dos títulos de valor ao preço actual do mercado. Se o valor no dia do fecho for baixo, o prejuízo aumento. Se for alto, o banco vai à falência.
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Só na América 304 institutos hipotecários e 22 bancos pediram a insolvência nos últimos meses. O maior banco de investimentos e o mais famoso foi o Lehmann Brothers. Pouco depois de este falir seguiram-se os três maiores bancos da Islândia que também arrastaram o próprio estado da Islândia para a ruína. Se a Islândia faliu o que acontece com a Itália? A Grécia não estará também em perigo? E as finanças da Croácia estarão sólidas?
Esta é a grande pergunta dos últimos meses que os investidores financeiros de todo o mundo se colocam. De um momento para o outro os títulos de valor, que nada têm a haver com as hipotecas dos EUA, também perdem valor, nomeadamente os créditos estatais da Islândia, da Itália e da Grécia.
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Para os 300 especialistas em balanço do Commerzbank isto significa reavaliar constantemente o capital do seu banco. Está cada vez menor. Os números que os contabilistas entregam esta semana a Eric Strutz permitem-lhe reproduzir o curso da crise. Correcções dos valores na sequência da crise Subprime desde Agosto: 144 milhões de Euros. Depois da falência do Lehman: 371 milhões de Euros. Seguem-se as dificuldades na Islândia: 260 milhões de Euros.
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Quem ainda tem dinheiro investe-o e depois da crise será mais rico do que antes.
O resultado é que os bancos em todo o mundo precisam urgentemente de dinheiro para compensar as perdas de valor, muito mais dinheiro do que tinha sido investido nos créditos americanos Subprime. De repente já não se tratava de cem milhões de dólares, mas de muitos bilhões.
Outro resultado também é que as bolsas de todo o mundo de repente oferecem muito dinheiro para ganhar.
Mas as acções de quase todas as empresas não estão a perder valor desde há muitos meses? Não se fala de 23 bilhões de dólares que arderam nas bolsas?
Exactamente. O dinheiro desapareceu, mas não se queimou. Evaporou-se e isto tem outro significado nas bolsas. É como o vapor que se transforma em água quando arrefece. Assim, o dinheiro torna-se líquido e aparece.
Acontece que em muitos casos agora pertence a outras pessoas.
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"Vá ao 2iq e pergunte pelo Sílvio Berlusconi" disse Max Otte.
Num edifício de escritórios junto a um cruzamento e perto do edifício de bancos em Frankfurt encontram-se os irmãos Patrick e Robert Hable a avaliar os dados do mercado de capitais. Trata-se de dados especiais, os denominados negócios de insider.
Basta premir na tecla e Patrick Hable lê no monitor quem são os gestores que compraram acções das suas empresas para o seu depósito particular. São imensos. "Os dirigentes aproveitam os baixos valores da crise para comprar acções económicas", diz Hable.
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Levará muito tempo até o valor das acções aumentar e estabilizar. Mas quando chegar o momento uma grande parte dos bilhões que desapareceu das bolsas durante a crise ressurgirá. E pertencerá aos que investiram durante a crise, aos gestores de topo, aos investidores ricos, portanto aos que já tinham recebido o dinheiro nos anos passados. Um exemplo é Silvio Berlusconi. Em meados de Outubro o Primeiro-Ministro italiano e também empresário investiu 16 milhões de Euros em acções da sua empresa de meios de comunicação, a Mediaset, no momento em que esta tinha atingido o valor mais baixo de sempre.
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Outro exemplo é Warren Buffet. O investidor financeiro, e homem mais rico do mundo, acabou de comprar parte do grupo americano General Electric por 2,1 mil milhões de dólares.
E há também o príncipe saudita Alwaleed Bin Talal, que na semana passada anunciou a compra de acções da empresa americana Citibank, na qual o governo dos EUA injectou um capital de 20 mil milhões de dólares, por 350 milhões de dólares. A China aproveita a crise para entrar nas empresas ocidentais a baixo custo.
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Um dos maiores vencedores da crise poderá ser um homem magro com óculos, que fala em tom baixo e sorri frequentemente entre as frases que pronuncia. O homem chama-se Gao Xiqing. No interesse do seu superior, a República da China, investirá 80 mil milhões de dólares em empresas estrangeiras nos próximos meses. Gao Xiqing é chefe da China Investment (CIC), um dos maiores fundos estatais do mundo criado recentemente.
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Há vinte anos, no início do verão de 1989, o homem de 55 anos participou na manifestação na Praça da Paz Celestial (ou Praça de Tiananmen) em Pequim. O exército matou vários milhares de pessoas, mas Gao abandonou a praça antes deste acontecimento. Conforme afirma mais tarde, tinha chegado à conclusão que havia uma melhor forma de reforçar a democracia na China e desenvolver a economia. O governo investiu 200 mil milhões de dólares na CIC. A missão de Gao Xiqing é aumentar a riqueza do estado chinês. No ano passado Gao adquiriu uma parte da Morgan Stanley, o segundo maior banco de investimentos nos EUA por 5 mil milhões de dólares.
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Em Abril entrou com 4,4 mil milhões na JC Flowers, o fundo de um antigo gestor do Goldman-Sachs, que tinha como objectivo a compra económica de empresas financeiras debilitadas. Meses mais tarde, em Setembro, Gao desloca-se aos EUA e negoceia de novo com o chefe do Morgan Stanley. Ele pretendia aumentar a sua participação no banco para 49 porcento. No entanto, quem ganhou foi o gigante dos bancos japoneses Mitsubishi UFJ. Diz-se que foi por motivos políticos. Já há muitotempo que os políticos americanos suspeitavam que o CIC pretendia comprar o seu país.
Gao Xiqing dá sempre a mesma resposta, que "a influência política não é da sua conta. Só queremos fazer lucro. Ainda só estamos no início."
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No final da conversa Max Otte colocou um livro na mesa. Tem como título Der große Crash 1929 (título original: Great Crash 1929). O autor, John Kenneth Galbraith, morreu há dois anos com 97 de idade. Ele é considerado um dos economistas mais importantes do século XX. No seu livro explica como se desenvolveu a crise financeira mundial dos anos 30. Uma editora alemã reeditou o livro e Otte escreveu o prefácio.
Nos anos 30 os bancos também foram à falência e as acções perderam valor. Galbraith avançou com uma explicação interessante; Os ricos tinham-se tornado demasiado ricos.
O 0,1 por cento dos americanos mais ricos detinha nessa altura perto de 40 por cento do capital total. Como resultado, Galbraith aponta que muitos não sabiam o que fazer com o dinheiro, portanto começaram a especular e a procurar novos produtos de investimento.
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Nunca mais a riqueza dos EUA ficou distribuída de forma tão desequilibrada como então. Desde há alguns anos a situação parece-se inevitavelmente com os dos anos dourados 20. E mais uma vez chegamos a uma grande crise.
Os ricos tornaram-se novamente demasiados ricos?
No entanto, a perspectiva pode dar uma volta de 180 graus. É possível que os americanos pobres fossem demasiado pobres, e não apenas eles, os trabalhadores sazonais e as empregadas domésticas, mas também a classe média. Entretanto, os 40% da classe menos privilegiada detêm apenas 0,2 por cento do capital total dos EUA. Quem, no passado, quisesse manter o passo a nível social só tinha uma opção. Tinha que levantar um crédito para os estudos dos filhos, para o seguro de saúde, para a casa.
Por fim haviam muitas pessoas incapazes de pagar as suas dívidas. Por este motivo, é agora o Estado a pagá-las em quase todo o mundo."

Os Estados da economia liberal, herdaram os produtos tóxicos...

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